ALGAZINE

COOL ZINE DO BAIRRO

10:35

O Homem Irresistível

Postado por Algazine |


Não era nenhum feriado nacional para as pessoas da Rua da Praia estarem paradas em horário de trabalho. Muito menos um dia de eclipse para olharem o céu. No alto da sacada de um velho prédio, desses que só está de pé para acabar com a dúvida de morrer de alguma alma desamparada, Ana Spier entrava em contato consigo mesma e mergulhava em um mar de memórias. Entre piqueniques, jantares à luz de velas e juras de amor eterno, se despedia daquela platéia, que, nas sacadas, formava os camarotes, e o público geral na rua.
O som das sirenes se aproximava; não seria emocionante se chegasse a tempo. Todos queriam um espetáculo completo, com um digno grand finale, mas sabiam que isso só ocorreria de um modo.
Pedro Nazar, pouco depois, lavava seu carro até ser interrompido por dois oficiais de justiça, que, sem meias palavras, o levaram algemado. Por quê? Pedro não tinha a mínima idéia.
Os boatos no caminho até a delegacia eram de que se tratava de um maníaco, um homem que precisava ser controlado. Cinco era o número de vítimas no último ano, todas com o mesmo fim. Logo sua advogada de defesa lhe informou que provavelmente seria pena de morte, ou prisão perpétua. Acreditava-se que o número de vítimas poderia ser maior.
No entanto, Nazar continuava desconhecendo o motivo de sua prisão. Estranhava também o fato da advogada lhe fazer, ao menos, três visitas diárias, e ainda por cima trazer alguns presentes, que, segundo ela, seriam para diminuir a falta de conforto.
Pedro ao menos admitia que a madura advogada não era exceção; afinal, as mulheres sempre foram um problema na sua vida, não por falta, mas sim uma demasia que ele próprio não poderia conter - não foram poucas as brigas entre elas ou com seus namorados, porém o amável rapaz nunca se declarou culpado de ser romântico.
No dia do julgamento, estava tranqüilo; tinha certeza de que era tudo um engano, pois realmente não tinha coragem alguma para machucar alguém, quanto mais tirar a vida. A juíza no tribunal se apresentou desferindo um olhar fatal para seu corpo. Em seguida, as testemunhas começaram a dar continuidade ao processo. Primeiro, um jovem rapaz que se dizia irmão de uma das vítimas de Pedro depôs que sua irmã começara a ingerir grandes doses de calmantes logo após o sumiço do rapaz; não resistindo a tamanha dor, morrera semanas depois. Depois, um homem de cerca de 50 anos, que misturava uma profunda tristeza com um ódio imensurável, apenas incitou ameaças contra a vida de Pedro, não conseguindo ajudar no processo penal. Os guardas foram obrigados a retirá-lo do recinto. Sua filha também falecera meses antes.
O mesmo ocorreu com as outras nove ou dez testemunhas seguintes, até uma moça magra e parecendo muito mais velha do que realmente era sentar na cadeira das testemunhas sem capacidade de dar informações - apenas chorou. Até que, numa última tentativa, com muito esforço, conseguiu murmurar algumas palavras. Voltou-se para Pedro e emitiu sons como: “se não era para sempre”, e, logo em seguida, finalizou com a palavra “amor”. Tal moça havia tentado o suicídio três vezes e agora passava os dias em uma clínica de reabilitação.
A juíza pediu para o rapaz se aproximar, mas uma reação avarenta partiu da advogada, que o segurou e disse que não havia obrigação dele fazer tal ato. De qualquer forma, Pedro o fez e, aproximando-se da Excelentíssima, ouviu apenas uma indagação de por quê. Ela insistiu em que o jovem não tinha culpa direta, mas o corpo do júri, todo formado por homens, se reuniu para a decisão.
Tempos depois, todos voltaram à sala. A advogada soltava doces palavras no ouvido do agora preocupado carpinteiro Pedro. O júri deu a ordem e a juíza seria a porta-voz de seu resultado. Em frases curtas, ela sentenciou que, para os jurados, Pedro deveria ser encaminhado à última instância, ou seja, nada menos que a pena de morte, devido não aos apenas cinco, mas agora oito vítimas de que já se tinha conhecimento.
Com o direito de seu intelecto e outros interesses, a juíza então declarou que Nazar iria cumprir prisão perpétua, por cometer o crime de ser irresistível e incapaz de viver numa sociedade com outras mulheres.
Não havia como recorrer, mas a advogada nunca desistiu.
Duas semanas depois, estava escuro na cela - apenas Pedro Nazar dormia lá. Ouviu-se uma voz - era a juíza.
Rodrigo Adamski

1 comentários:

Lucas Kafruni disse...

hehehe muito boa história!!! demais!! abrasss

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